Continuidade das chuvas no RS preocupa produtores. Por outro lado, safra internacional não deve ser tão ruim.
O mercado doméstico de trigo registra poucos negócios neste período de entressafra, com moinhos tentando adquirir lotes a preços mais baixos, enquanto os produtores seguram os cereais de melhor qualidade.
“A volatilidade dos preços internacionais e do câmbio torna arriscado qualquer movimento mais contundente de compra. Os produtores estão com as atenções voltadas para o campo e, sabendo da escassez de oferta interna e do longo período de entressafra, seguem pouco flexíveis em suas pedidas”, disse Elcio Bento, analista de trigo da Safras & Mercado.
O Centro de Estudos em Economia Aplicada (Cepea) também divulgou nesta terça-feira (18/06), que a liquidez está baixa e os preços têm alta em relação ao mês passado, mas caíram nos últimos dias. O valor médio do trigo no Paraná estava ontem em R$ 1.515,04 a tonelada (US$ 279,32), 0,17% menos que no dia anterior, mas 2,08% acima do praticado no mesmo dia de maio.
No Rio Grande do Sul, a variação entre os dias é de 0,02%, mas em um mês, 7,22%, justificada pela dificuldade de escoar o cereal existente nos silos do Estado. A cotação média é de R$ 1.431,51 a tonelada (US$ 263,92).
Safra
O plantio de trigo começou neste mês nos Estados do Sul do país, com a expectativa de uma área menor que em 2022/23. Na semana passada a consultoria Safras & Mercado, indicou 2,995 milhões de hectares, 11,5% menos que no ciclo anterior. A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) apontou 3,078 milhões de hectares, com queda de 11,4% entre as temporadas.
Os paranaenses devem plantar 1,15 milhão de hectares, 14,2% a menos do que em 2022/23. A superfície gaúcha deve somar 1,27 milhão de hectares, queda de 12,4% ano a ano.
Apesar disso, a produção brasileira deve crescer em 2023/24, graças a um aumento na produtividade. No ciclo passado, a safra foi prejudicada por chuvas na época da colheita, que resultaram num rendimento médio de 2.530 quilos por hectare. Neste ano, a projeção de Safras & Mercado é de 3.015 quilos por hectare. A estimativa da Conab aponta para 2.945 quilos por hectare, alta de 26,3% em relação ao ciclo passado.
Se os números se confirmarem, a safra nacional totalizará 9,03 milhões de toneladas, com crescimento de 5,5%, segundo a consultoria, ou 9,07 milhões, conforme a Conab. O Paraná deve colher 3,75 milhões de toneladas, 2,7% acima do ciclo passado. O Rio Grande do Sul fica logo atrás, com 3,6 milhões de toneladas projetadas, um aumento de 14,3% ano a ano.
O Departamento de Economia Rural (Deral), da Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento do Paraná, informou, em seu relatório semanal, que o plantio da safra 2023/24 de trigo do Estado atingiu 82% da área estimada de 1,117 milhão de hectares.
Plantio no RS
No Rio Grande do Sul, segundo a Emater/RS, as condições climáticas observadas na última semana favoreceram a intensificação da semeadura das lavouras. Durante a semana, houve intensa movimentação de tratores e máquinas semeadoras, visando ampliar a extensão cultivada, considerada em atraso.
No entanto, a volta das chuvas no Estado tem causado preocupação. Nesta terça-feira, Almir Trevisan, assessor da cooperativa C.Vale, divulgou um vídeo das lavouras em Cruz Alta, afirmando que as precipitações estão prejudicando o trigo recém semeado. Segundo ele, algumas sementes foram varridas e também a primeira camada de solo.
“Se parar de chover, ainda dá tempo de replantar, mas os preços têm que compensar e o clima ajudar”, declarou.
Em entrevista à reportagem há poucos dias, Christian Saigh, presidente do Sindicato da Indústria de Trigo de São Paulo (Sindustrigo- SP), membro da diretoria Associação Brasileira da Industria de Trigo e Derivados (Abitrigo) e diretor presidente do moinho Santa Clara, afirmou que os moinhos brasileiros estavam com estoques para 30 dias porque até pouco tempo não havia sinais de problemas de abastecimento. Entretanto, nas quatro últimas semanas, além dos problemas no Rio Grande do Sul, secas castigaram as lavouras da Europa e da Rússia.
Como consequência imediata, os custos dos moinhos têm crescido e o consumidor já pode esperar para o fim deste mês um aumento dos preços das farinhas. “A matéria-prima é 70% do custo de um moinho e, como todos estavam com estoques curtos, vão ter que comprar mais trigo e repassar ao mercado”, afirmou.
Preços internacionais
Apesar desse cenário, ontem, os preços do trigo caíram 3,47% na bolsa de Chicago, com a notícia de que a safra da Ucrânia não será tão ruim como se imaginava. O Ministério da Agricultura do país afirmou que a colheita chegará a 21 milhões de toneladas, 2 milhões acima da previsão oficial anterior. Desse total, 15 milhões provavelmente irão para o mercado externo. “Claro que essas exportações estão sujeitas a um elevado nível de incerteza devido à guerra em curso. No entanto, a Ucrânia conseguiu manter as suas exportações de cereais sem perturbações significativas no ano passado, apesar do cancelamento do acordo de cereais pela Rússia em julho e dos repetidos ataques russos à sua infraestrutura, então é um alento para o mercado”, escreveu o Commerzbank em relatório hoje.
Além da Ucrânia, na Argentina, a projeção de colheita cresceu, passando de uma estimativa inicial de 17 milhões de toneladas para 21 milhões.
E, nos EUA, a colheita avança em um ritmo acelerado. Segundo o Departamento de Agricultura do país (USDA) chegou a 30% da área semeada no último domingo (16/04), em comparação a 12% no mesmo período do ciclo passado. “A condição das lavouras também é considerada muito boa, o que dá esperança de uma colheita robusta em geral”, afirmou o Commerzbank.
A incógnita, então, fica por conta da Rússia, onde a perspectiva de colheita passou de 98 milhões de toneladas há dois meses para 83 milhões agora, devido ao tempo seco. “A perspectiva de safra na Rússia teve um colapso muito grande. Eles deverão colher 15 milhões de toneladas a menos, e esse número pode aumentar dependendo do quadro de seca no país. A Rússia pode inclusive limitar suas exportações para garantir o abastecimento interno”, afirmou Luiz Pacheco, analista da T&F Consultoria Agroeconômica. É isso que será determinante para os preços.