Oleaginosa é eficiente na rotação de culturas, tem paridade com a soja e apelo como biocombustível
A canola é a “bola da vez” entre as culturas de inverno do Rio Grande do Sul. Os gaúchos elevaram a área plantada do pequeno grão devido à eficiência da planta na rotação de culturas, combinada com a lucratividade e garantia de compra com preço praticamente fechado já no plantio. Segundo estimativas da Emater-RS (empresa pública de extensão rural do Rio Grande do Sul), a área plantada da canola, também chamada de “soja de inverno” por sua paridade de preços com o grão mais produzido no Brasil, alcançou o recorde de 135 mil hectares nesta safra em comparação com os 77 mil hectares do ano passado. O volume produzido deve subir de 134 mil toneladas para 226 mil toneladas.
A Associação Brasileira dos Produtores de Canola (Abrascanola) tem números diferentes para o Estado, que responde por cerca de 95% da produção nacional, mas com a mesma tendência de alta: 179 mil hectares de área plantada neste ano em comparação com os 105 mil do ano passado. A expectativa de colheita é de 270 mil toneladas, a maior da história.
Alencar Paulo Rugeri, assistente técnico estadual em culturas da Emater-RS, diz que um atrativo da canola é ser uma cultura de cadeia quase fechada, como a cevada, ou seja, o produtor planta sabendo para quem vai vender e com um indicativo de preços, que neste ano estão melhores do que em anos anteriores.
“No Rio Grande do Sul não há competição entre as culturas de inverno porque temos muita área para expansão, já que o Estado planta 7 milhões de hectares no verão e apenas 2 milhões no inverno, mas canola é uma boa opção para o produtor porque seu custo de produção não é tão elevado e ela tem uma questão fitossanitária mais favorável que a do trigo, por exemplo.”
Rugeri adverte, no entanto, que a canola não é uma cultura para “plantadores” e sim para agricultores com sistema de produção estabelecido de rotação de culturas porque demanda planejamento, gestão e muito profissionalismo.
Vantuir Scarantti, presidente da Abrascanola há oito anos e diretor da Celena Alimentos, indústria que processa cerca de 75% da canola brasileira, diz que, no ano passado, houve muita chuva e a produtividade média da canola foi de apenas 24 sacos por hectare.
“Pagou as contas, mas neste ano, apesar da implantação inicial ter sido irregular por causa das inundações no Rio Grande do Sul, o clima tem ajudado mais e a perspectiva é de safra recorde, com aumento de média para 26 sacas por hectare.”
Ele também destaca que a canola não é uma cultura com tantas exigências como o trigo, está bem adaptada e tem o atrativo da liquidez, com contrato travado na compra de sementes, mas diz que um fator que pode impulsionar ainda mais a canola no país entre as culturas de inverno é o crescimento do mercado de biocombustíveis.
A canola é uma oleaginosa de flores amarelas desenvolvida por meio de melhoramento genético a partir das sementes de colza canadense. Atualmente, a maior parte da produção é processada para a fabricação de óleo vegetal para alimentação humana, mas um percentual pequeno já vai para biocombustível e exportação. O Brasil, que tem cerca de 500 produtores de canola, começou a exportar o grão in natura no ano passado.
Produtores
Marcos Aurélio Pilecco, engenheiro agrônomo e produtor de grãos em São Luiz Gonzaga, região noroeste do Estado, que concentra a maior área de cultivo da canola, foi um dos que elevaram a área de canola. Ele plantou nesta safra de inverno 55 hectares ante os 40 hectares do ano passado e também investiu no cultivo de trigo e de aveia branca para pastagem de seus 140 bovinos de corte. No verão, planta 260 hectares de soja e 50 hectares de milho.
“A lucratividade da canola é um fator importante, embora não seja o principal para mim. Tenho um comprador direto, a Coopatrigo, que faz um contrato de venda com a indústria Celena. O preço é definido em função do mercado internacional, mas mantém uma paridade com a soja de cerca de 90%.”
O fator dominante para o aumento de área da canola em sua fazenda, explica Pileco, é a eficiência da cultura no esquema de rotação de culturas. “A canola proporciona um tipo diferente de raiz, faz uma certa descompactação do solo e elimina o azevém, que é uma planta daninha no inverno de difícil e caro controle na cultura do trigo.”
Pilecco conta que colheu 18 sacos de canola por hectare no ano passado, quando houve excesso de chuvas. Neste ano, embora uma seca tenha atrasado o plantio, estima uma produtividade de 30 sacas por hectare, que ele considera um ponto de equilíbrio, mas diz que há produtores na região que devem chegar a 40 sacas.
O agricultor é um dos participantes do Programa Canola da Coopatrigo, que tem sede em São Luiz Gonzaga e mais 16 unidades de recebimento de grãos no Estado. Segundo o engenheiro agrônomo e gerente técnico da cooperativa, Bento Jacó Buttenbender, o cultivo já vinha crescendo e, neste ano, houve um aumento de 30% de área em relação a 2023.
Ele vê três motivos para o aumento: a planta faz o controle de invasoras na cultura do trigo, gera renda para o produtor numa época diferente e casa muito bem na rotação de culturas para fertilidade do solo e ciclagem dos nutrientes. Neste ano, a Coopatrigo espera receber 570 mil sacas de canola ante as 358.111 do ano passado.
Alceu Reinoldo Uecker, produtor em Coronel Barros, também na região noroeste gaúcha, planta canola há 20 anos. Neste ano, ele reduziu a área para 50 hectares, ante os 60 hectares do ano passado, por causa do seu sistema de rotação de culturas, mas espera uma produtividade maior, de 32 sacas por hectare.
“Entrego a canola na Copagril. É uma planta muito eficiente na rotação de culturas, além de ser atrativa para o produtor pela garantia de compra na paridade com a soja e pela lucratividade maior e custo de produção menor na comparação com o trigo, que sempre tem mais risco.”
Cultura em crescimento
Bruno Laviola, pesquisador na Embrapa Agroenergia, diz que o cultivo da canola no Brasil esteve em situação de estagnação, com área de 35 mil a 40 mil hectares por dez anos, mas agora está em franco crescimento, podendo chegar a 300 mil hectares nos próximos anos, devido ao avanço na curva de aprendizado dos produtores, que já conseguem produtividades mais altas e consequentemente rentabilidade maior.
“Além disso, diz, a cultura é beneficiada pela tendência nacional e mundial da demanda maior de óleos vegetais para a produção de biocombustíveis.”
A melhoria da qualidade do solo e o controle de pragas e doenças são vantagens da canola em relação a outras culturas de inverno no sistema de rotação de culturas. A soja, diz o pesquisador, sofre com nematóides e a canola não propaga nematóides, ao contrário, ajuda a reduzir. A principal doença da canola é o mofo branco, mas há facilidade de controle.
Laviola explica que o principal polinizador da canola são as abelhas, o que impede o uso de determinados inseticidas na lavoura. Por isso, a Embrapa trabalha no desenvolvimento de bioinsumos para a cultura.
Além do Rio Grande do Sul, há cultivos de canola no Paraná, Santa Catarina e testes de tropicalização no Cerrado brasileiro.
“Já temos plantio de algumas áreas pequenas no Cerrado, como opção de segunda safra em rotação com milho, visando diversificar as culturas e melhorar a qualidade do solo”, diz Laviola.
Todas as cultivares usadas no Brasil são importadas. A Embrapa trabalha na seleção e melhoramento genético para o grão se adaptar ao Cerrado e a temperaturas mais altas, assim como fez com o trigo. Os testes começaram em 2015, com foco na produção de biocombustíveis. A estimativa é lançar em dois anos a primeira variedade nacional da semente.
“É uma cultura que poderia ganhar escala de produção no Brasil. Podemos ter um salto de produtividade com o desenvolvimento de cultivares. Na última safra, tivemos o plantio de 45 milhões de hectares de soja no verão. Se 10% dessa área fosse destinada para a canola, seriam 4,5 milhões de hectares. Se chegasse a 20%, o Brasil poderia ser o maior produtor mundial de canola. Isso sem precisar abrir área e sem competição com alimentos”, diz.
Hoje, o maior produtor mundial da canola, terceira maior oleaginosa do mundo depois do dendê e da soja, é o Canadá, com 9 milhões de hectares.
O pesquisador destaca que usa apenas o óleo de canola em sua casa porque o produto tem 90% de ácidos graxos insaturados, o que é benéfico para a saúde, e vitamina E para redução de colesterol.