
Segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, em 2024, pelo menos 40 milhões de pessoas foram deslocadas de suas casas devido a eventos climáticos extremos. O dado evidencia que a crise climática já é uma realidade que demanda uma resposta coordenada, incluindo inovação tecnológica no oceano e mudanças na matriz agroalimentar brasileira. Essa foi a principal conclusão da mesa redonda “Estratégias de Mitigação e Adaptação Climática Viáveis do Ponto de Vista da Ciência”.
O debate reuniu pesquisadores e reitores de universidades federais na Casa da Ciência, espaço do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), durante a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP30), em Belém (PA).
Segundo o painelista Moacyr Araújo Filho, vice-reitor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e coordenador científico da Rede Clima, há potencial no fortalecimento de fontes alternativas de energia que garantam fornecimento contínuo, diferente da eólica e solar, que operam com apenas 40% e 20% da capacidade, respectivamente. Ele destacou que há outras formas de energia oceânica, como conversão térmica e pelas correntes marítimas intensas.
De acordo com Araújo Filho, o Brasil possui uma vantagem específica ao aproveitar a disposição de suas áreas oceânicas, especialmente na borda oeste, onde as correntes marítimas são mais fortes. Ele explicou que a diferença de temperatura nessas regiões permite a geração contínua de energia, mas o país ainda enfrenta o desafio de ampliar sua malha de transmissão para garantir a integração de várias fontes de geração.
Durante o debate, moderado pela reitora da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Aldenize Xavier, foi ressaltado que as soluções científicas existem, mas encontram obstáculos na falta de políticas públicas e na resistência de grupos de pressão que influenciam decisões do Poder Público em favor de interesses específicos.
Resiliência
Após as enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul (RS) em 2024, a reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Márcia Barbosa, destacou a necessidade de desenvolver instrumentos e planos que promovam a “resiliência climática”, diante da frequência crescente de desastres. Ela criticou a inação na prevenção e na resposta planejada, mesmo com alertas da comunidade científica.
Barbosa mencionou ações da UFRGS na adaptação às mudanças climáticas, como a criação de um Protocolo de Emergência Climática baseado em dados meteorológicos e a fundação da Rede de Emergência Climática Ambiental, que propôs inovações como o uso de concreto polimérico na reconstrução do aeroporto de Porto Alegre. A universidade planeja também instalar sensores no Oceano Atlântico, considerado uma das maiores vulnerabilidades da região.
Segundo Moacyr Araújo Filho, já foi atingido um limite importante: pela primeira vez, o aumento do nível do mar não é mais dominado pelo derretimento do gelo, mas pela expansão térmica da água devido ao aquecimento oceânico. Ele afirmou que, em 2024, dois terços do aumento do nível do mar foram causados pelo aquecimento do oceano, enquanto um terço resultou do degelo continental. Isso indica um ponto de inflexão preocupante.
Para Araújo Filho, a mitigação deve passar pela eliminação dos combustíveis fósseis, já que a compensação por meio de reflorestamento é insuficiente. Ele alertou que as reservas das 200 maiores petrolíferas do mundo exigiriam reflorestar uma área equivalente à América do Norte e que o planeta está “esgotado”, com o limite de aumento de temperatura de 1,5°C já superado. Além disso, o oceano está perdendo cerca de 10% de sua capacidade de absorver CO2, tornando necessária a remoção de carbono da atmosfera.
O debate também abordou a relação entre os biomas e a crise hídrica. O reitor da Universidade Federal do ABC (UFABC), Dácio Roberto Matheus, destacou que a crise hídrica de São Paulo (SP) decorre da alteração dos ciclos de rios aéreos, e que a solução envolve estratégias de conservação integrada, incluindo restauração de agroflorestas e regeneração natural, que demonstram benefícios econômicos, como o aumento de 28% na produtividade do café por conta da polinização.
O reitor da Universidade Federal de Jataí (UF Jataí), Christiano Peres Coelho, criticou o que chamou de “cinismo ambiental”, ao apontar que a cadeia agroalimentar é responsável por cerca de 75% das emissões brasileiras, com o Centro-Oeste apresentando um gado 470% maior que a população local. Ele defendeu a transição agroecológica, com sistemas de policultivo, agroflorestais e uso de bioinsumos como alternativas para mitigar os impactos no Cerrado.
O encontro reforçou que a ciência dispõe de soluções, mas sua implementação depende de articulação política e recursos. Ao encerrar o evento, os participantes destacaram a importância de transformar a troca de experiências em uma rede de ações de alcance nacional.
Casa da Ciência
A Casa da Ciência do MCTI, localizada no Museu Paraense Emílio Goeldi, é um espaço dedicado à divulgação científica, com foco em soluções para mudanças climáticas e sustentabilidade. No último dia de funcionamento, será o ponto de encerramento das atividades do ministério, promovendo exposições, rodas de conversa, oficinas, lançamentos e atividades interativas para o público geral.
Fonte: Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.








