Prato feito: como ícone da alimentação brasileira conecta campo e cidade

O Prato Feito une campo e cidade, garantindo nutrição acessível e sustentabilidade na prática. Defender o PF é valorizar a cadeia produtiva e quem trabalha no Brasil.

Arroz e feijão - prato feito
Foto: Licia Rubinstein/Agência IBGE Notícias

Arroz, Feijão, carne e salada. Parece simples. Mas o Prato Feito, o famoso PF, é muito mais do que um almoço barato. O Prato Feito é cultura alimentar brasileira, é nutrição real, é política social e, sim, já é ESG na prática. Se o Brasil quer falar sério sobre alimentação de verdade, precisa falar do PF.

Origem do Prato Feito

O Prato Feito não nasceu em restaurante chique. Ele nasceu da necessidade de alimentar quem trabalha. No final do século XIX e começo do século XX, surgiram nas cidades brasileiras as casas de pasto e pensões populares. Esses lugares serviam comida quente, rápida, farta e barata para viajantes, tropeiros e, depois, para trabalhadores urbanos que viviam longe de casa e muitas vezes não tinham cozinha.

A lógica era direta: um prato já montado, preço fechado, sem escolher item por item. Você sentava, comia e seguia.

Nas décadas de 1930, 1940 e 1950 isso ficou ainda mais forte. O Brasil se industrializou, e cidades como Rio de Janeiro, São Paulo e Belo Horizonte se encheram de operários, pedreiros, balconistas, motoristas — gente com pouco tempo e pouco dinheiro.

O botequim de esquina e o restaurante simples começaram a servir sempre o mesmo conjunto básico no mesmo prato: arroz, Feijão, uma proteína como bife, frango, linguiça ou ovo frito quando a carne encarecia, um acompanhamento barato como farofa, batata ou couve, e um pouco de salada.

Esse prato montado, servido rápido e vendido a preço fixo, passou a ser chamado de Prato Feito. O apelido virou sigla e nasceu o PF. Ou seja, o PF foi criado para garantir que o trabalhador comesse bem, gastando pouco e sem perder tempo. O PF é uma tecnologia social brasileira para manter gente em pé.

Existe um ponto essencial nessa origem: o coração do PF é a dupla arroz com Feijão. O arroz virou base energética do prato brasileiro. O feijão, presente na alimentação do país há séculos, entrega proteína, ferro, fibras e saciedade.

Arroz com Feijão juntos formam proteína completa e acessível. Isso é nutrição de verdade, não discurso publicitário — e é o que faz o PF ser imbatível até hoje.

O Prato Feito é ponte entre campo e cidade

Cada PF que chega à mesa liga quem planta e quem consome. O Feijão vem do produtor do interior. O arroz vem da lavoura que colheu, secou e armazenou.

A couve, o ovo, a carne, a salada vêm de famílias rurais que trabalham sob risco de clima, custo e crédito. Do outro lado está quem está na obra, no balcão, no caminhão, no caixa, no hospital, no porto. Gente que precisa comer e voltar para o turno.

O Prato Feito derruba uma mentira que foi sendo empurrada para o Brasil: a ideia de que o produtor rural e o consumidor urbano são lados opostos. Não são. Sem o produtor rural não existe PF na cidade. Sem o consumidor urbano não existe renda para quem planta.

Defender o PF é manter essa ponte viva. Atacar o PF é quebrar essa ponte.

O inimigo cresce: o nome dele é ultraprocessado

Enquanto o Prato Feito entrega comida de verdade, o mercado empurra substitutos. A troca da panela pelo pacote está acontecendo.

Cada vez mais famílias trocam comida real por produtos ultraprocessados que prometem praticidade e saúde, mas entregam excesso de aditivos e calorias vazias. É uma alimentação sem origem clara.

A pessoa come algo que não reconhece cru, que não saberia cozinhar em casa porque aquilo não existe fora da fábrica. Isso não é evolução alimentar. Isso é desistência alimentar. E tem um detalhe grave: o Prato Feito, que sempre foi a refeição que sustenta o trabalhador, começou a ser tratado como comida menor.

Muita gente repete que arroz com Feijão é comida simples, barata, de quem não tem escolha. Enquanto isso, produto caro e ultraprocessado é vendido como solução inteligente e moderna. Essa inversão é perigosa para a saúde pública e para a cultura alimentar brasileira.

Por que quase ninguém defende o PF em público

Existe um motivo: o Prato Feito funciona bem demais. O PF é nutritivo, barato, rápido, familiar e brasileiro. Não precisa de rótulo em inglês para parecer sustentável. Não precisa de celebridade para parecer desejável. Não precisa ser lançado — ele já está pronto há quase um século.

Para muita marca isso é um problema. O PF é simples demais para virar produto de marketing caro. É barato demais para virar pacote financeiro. E é brasileiro demais para caber naquele discurso de que a salvação vem de fora.

Quando eu digo que o PF é patrimônio do Brasil, não é romantização da cozinha da avó. É leitura estratégica. O Brasil já tem na mão uma solução alimentar que resolve fome, saúde e dignidade sem depender de produto artificial.

Não é nostalgia, é política nacional

Defender o Prato Feito não é saudosismo. Não é discurso de bons tempos. Defender o PF é falar de segurança alimentar, de produtividade e de respeito a quem trabalha. Existem três verdades objetivas:

  • O Brasil já tem um modelo de refeição completa, equilibrada e acessível. Esse modelo é o PF.
  • Esse modelo já é aceito culturalmente. Ninguém precisa ser convencido a gostar de arroz com Feijão.
  • O PF não recebe status oficial porque ele não interessa para quem lucra vendendo substituto ultraprocessado.

O PF e o ESG

Hoje todo mundo fala em ESG — ambiental, social e governança. O Prato Feito entrega ESG na prática.

No campo ambiental, o PF valoriza cadeias reais de alimento brasileiro, como arroz e Feijão, que entram em rotação de cultura e exigem menos processamento e embalagem do que ultraprocessados.

Em relação ao social, o PF garante refeição completa, nutritiva e acessível para o trabalhador. Isso reduz desigualdade alimentar e melhora saúde e produtividade.

No que diz respeito à governança, quando uma empresa apoia o PF, ela assume publicamente que está do lado da comida de verdade — e não apenas fazendo marketing verde.

Defender o Prato Feito é provavelmente a agenda ESG mais brasileira que existe, porque protege quem produz, alimenta quem trabalha e mostra compromisso concreto com o país.

O que precisa acontecer agora

Se o Brasil quer falar sério sobre alimentação de verdade, três coisas são urgentes:

  • Primeiro. O Prato Feito precisa ser reconhecido oficialmente como padrão alimentar brasileiro. O governo fala de cesta básica, merenda e combate à fome. Ótimo. Mas precisa também falar do PF — a refeição que sustentou e sustenta o Brasil que trabalha.
  • Segundo. A base do PF precisa ser protegida: arroz, Feijão, ovo, carne de verdade, verdura de verdade. Não existe PF forte com produtor fraco. Se quem planta quebra e quem cozinha não fecha a conta, quem paga é o trabalhador que depende desse prato no meio do dia.
  • Terceiro. Precisamos tirar o PF da defensiva. Arroz com Feijão não é plano B. Arroz com feijão é referência. O resto é que precisa se justificar.

Defender o PF é defender o Brasil

O Prato Feito nasceu para alimentar o trabalhador brasileiro com dignidade. Ligou campo e cidade. Entregou nutrição e identidade. E continua sendo hoje a refeição mais honesta, mais completa e mais brasileira que existe.

Quando tentam vender o futuro da alimentação em pó, sachê ou caixinha, a resposta continua a mesma: o futuro do Brasil cabe num prato comum — arroz, Feijão, proteína e salada.

Defender o Prato Feito é defender quem planta, quem trabalha e quem come. Defender o Prato Feito é defender o Brasil.

*Marcelo Lüders é presidente do Instituto Brasileiro do Feijão e Pulses (Ibrafe), e atua na promoção do feijão brasileiro no mercado interno e internacional


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Fonte: Canal Rural.