Cássio Dias, primeiro negro a conquistar o título da PBR, sonha em fazer história e ganhar mais quatro ou cinco fivelas de ouro
“Comprar mais colheitadeiras.” Esse é o plano do campeão mundial de rodeios da temporada 2024, o mineiro Cássio Dias Barbosa, para a bolada de US$ 1 milhão (R$ 5,15 milhões) que ele ganhou como prêmio extra pelo título conquistado no dia 19 de maio, na final do campeonato mundial de montaria em touros da Professional Bull Riders (PBR), em Arlington, no Texas (EUA).
Antes, nas etapas regulares, o brasileiro de 22 anos, que mora há um ano em Ardmore, no Estado americano de Oklahoma, já tinha ganho US$ 550 mil. De quebra, foi eleito o melhor estreante do ano.
“Meu sonho é comprar uma fazenda, mas, por enquanto, estou investindo em colheitadeiras de soja e milho em Minas para prestação de serviço. Já tenho duas e devo comprar mais agora”, disse o primeiro peão de rodeio negro a ganhar o mundial da PBR.
Cássio afirma que nunca sofreu preconceito racial, mas diz que há poucos negros nas arenas americanas e sua vitória pode influenciar outros a também buscar um “lugar ao sol”. Questionado se pode quebrar o recorde mundial de títulos estabelecidos pelos únicos tricampeões da categoria, os brasileiros Adriano Moraes e Silvano Alves, Cássio diz ser possível.
“Penso em fazer história. Se Deus ajudar, acho que dá para ganhar uns quatro ou cinco títulos nos Estados Unidos. Mas não quero viver só montando touros. Depois que me aposentar, penso em voltar para o Brasil, ir para a roça e pescar.”
Pelo menos dois campeões mundiais dizem acreditar nesta possibilidade. Guilherme Marchi, vencedor em 2008, e o recém aposentado Ednei Caminhas, vencedor em 2002, também apostam que o mineiro tem potencial para ser o maior vencedor da história da PBR.
Do braço do sofá aos touros de quase uma tonelada
Barbosa nasceu em Itapagipe (MG), foi criado no município vizinho, São Francisco de Sales. Conta que morava na cidade, mas passava a maior parte do tempo no rancho de primos, onde começou a montar bezerrinhos. Antes, montava em casa, no braço do sofá.
Estudou até o sexto ano. Com 12 anos, disse à mãe que iria vender picolé para comprar passagem para São Paulo, a fim de montar em rodeios. Aos 14 anos, já estava desafiando touros nas arenas, seguindo o exemplo do pai e dos tios.
Cássio Dias desembarcou nesta quinta-feira (23/05) no Brasil para uma temporada de férias e para se recuperar da lesão que sofreu uma semana antes das finais. Ele foi pisoteado por um touro na terceira rodada das eliminatórias, desmaiou e sofreu fraturas em cinco vértebras.
Ficou três dias internado sem saber se poderia montar nas rodadas seguintes das finais. “Achei que não ia conseguir. Na cama do hospital, tive medo de perder o título, mas a vontade de ganhar venceu as dores.”
Foi liberado pelos médicos no sábado (18/5), montou dois touros e caiu antes dos oito segundos porque sentiu muitas dores nas costas e tinha receio da sua condição piorar. Voltou à arena no domingo, driblou o medo e as dores e montou com sucesso nas duas rodadas.
Como seu rival, John Crimber, de 18 anos, chegou à última montaria com 238,5 pontos a menos no ranking e foi derrubado em 2,83 segundos, Cássio nem precisava ter montado duas vezes para ser o campeão. Mas, enfrentou o desafio e fechou a temporada com um aproveitamento de 58% nas montarias ao longo da temporada.
Festa em Casa
Na volta ao Brasil, o campeão foi recepcionado com festa em Votuporanga (SP), no sábado (25/05), pela companhia de touros de Tércio e Rosana Miranda, com a presença de seus pais. No domingo (26/05), chegou a São Francisco Sales, onde recebeu homenagem da prefeitura e dos amigos.
Antes de seguir para as festas, o casal passou dois dias em São Paulo para renovar o visto de atleta. Dia (05/07), Cássio e Juliana voltam para os Estados unidos, onde ele vai defender pelo segundo ano consecutivo o time do Kansas City Outlaws na competição de equipes da PBR.
O mineiro de 1,65 m de altura e 63 quilos disse que sonhava ser campeão mundial, depois da conquista dos títulos da PBR nacional e do campeonato da Ekip Roseta, mas ficou surpreso com a conquistar ter vindo tão rapidamente.
“Não esperava tanto, não. Só queria montar meus touros. Nos EUA, os touros são mais rápidos, pulam demais e exigem uma postura diferente.”
A força e a parceria da mulher
Juliana, nascida em Alto Taquari (MT), conheceu Cássio em um rodeio na região de Fernandópolis, na divisa São Paulo-Minas. Em Arlington, não segurou a emoção e subiu no pódio para beijar o marido campeão mundial.
“Não dá nem para acreditar. Deus é muito bom para nós. Sair de uma cama de hospital direto para aquela taça. Ele se recuperou rápido na semana e agora vai ter um bom tempo para descansar e ficar pronto para a Team Series.”
Na volta aos Estados Unidos, o casal vai retomar com intensidade as aulas de inglês, interrompidas para a disputa das finais da PBR. “Já estamos falando um pouquinho”, disse Cássio, que, na conquista e nas entrevistas nos EUA, tem sempre a tradução do peão aposentado Paulo Crimber, pai de seu principal rival na temporada, John Crimber.
Juliana, que pretende seguir a carreira de médica veterinária de reprodução de equinos, já fez um estágio em um rancho nos Estados Unidos e agora vai buscar uma licença profissional e emprego na área. “A gente tem muitos planos e pretende ter filhos, mas não agora.”
Além da mulher, outra pessoa fundamental na conquista de Cássio e em sua recuperação é Guilherme Marchi, que recepcionou o mineiro em terras norte-americanas e tornou-se seu mentor e treinador. Foi Marchi que indicou o pupilo para integrar o time do Kansas, convencendo JW Hart de que Cássio era o peão que a equipe precisava.
“Guilherme me mostrou que eu era bom na montaria e me incentivou a melhorar e nunca desistir. ‘Você não é peão para cair desse touro’, me disse muitas vezes”, diz Cássio.
Vêm do treinador adjunto do Kansas City também as dicas de que a preparação física é tão ou mais importante para o peão que o treino em touros. Cássio faz treinamento físico puxado em academia várias vezes por semana, treina em touro duas ou três vezes e se recupera das dores com banho de imersão em gelo, alternado com água quente. “É como nascer de novo. No Brasil, eu não tinha esse tipo de treinamento.”
Agora, nas férias, o que ele vai fazer é fisioterapia, para voltar 100% para os Estados Unidos. Na temporada passada, o Kansas terminou em segundo lugar e Cássio foi a estrela emergente do time.
Montou com sucesso 20 dos 28 touros que enfrentou, foi o MVP (most valuable player, ou jogador mais valioso) em duas etapas. Só perdeu esse título na temporada para outra estrela brasileira dos rodeios: José Vitor Leme, do Austin Gamblers.
Fonte: Globo Rural