A produção de leite no Brasil enfrenta desafios crescentes. No Rio Grande do Sul, um estado com forte tradição no setor, o número de produtores de leite diminuiu para aproximadamente 28 mil, representando apenas um terço do volume registrado há uma década. De acordo com associações setoriais, essa conjuntura é resultado da combinação de custos elevados, preços de venda baixos e o aumento nas importações de produtos lácteos, especialmente de nações do Mercosul.
Em 2025, o valor recebido pelos produtores, que tradicionalmente aumenta durante o inverno, apresentou uma tendência de queda contínua. Dados compilados pelo Cepea indicam que a média nacional em outubro foi de R$ 2,22 por litro. Em contraste, no mesmo mês de 2024, o valor era de R$ 2,66. Em Santa Catarina, o valor médio alcança R$ 2,14, enquanto o custo de produção supera R$ 2,20, o que mantém milhares de produtores em situação de prejuízo.
O presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), João Martins, declarou que o país atravessa uma crise sem precedentes no âmbito do setor lácteo. Ele ressalta que o Brasil conta com mais de um milhão de produtores de leite, dos quais mais de 80% são pequenos produtores. “Hoje, esses produtores enfrentam uma crise profunda e injusta”, enfatizou.
Martins relembrou que, enquanto em agosto de 2025 o litro de leite era negociado a R$ 2,77, atualmente há relatos de preços próximos a R$ 1,60. Esse valor, segundo ele, é insuficiente para cobrir os custos básicos de produção. “Isso se traduz em perda de renda no campo, propriedades em risco e famílias desassistidas. O Brasil corre o risco de perder a sua base produtiva de leite”, alertou.
A CNA informa que tem envidado esforços desde 2024 para investigar práticas de dumping, caracterizadas pela venda de produtos estrangeiros no mercado interno a preços artificialmente baixos. Contudo, o pedido de investigação foi negado pela Câmara de Comércio Exterior (Camex), vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.
“Agora é o momento de agir com responsabilidade e sensibilidade”, demandou Martins, em um apelo direcionado ao vice-presidente e ministro Geraldo Alckmin. “Se o governo não intervir, veremos produtores endividados, o abandono da atividade e uma crescente dependência de importações. Precisamos garantir a proteção do leite brasileiro.”
A Federação da Agricultura do Estado de São Paulo (Faesp) também se somou à mobilização nacional. O presidente da entidade, Tirso Meirelles, classificou como “absurda” a decisão da Camex em negar a existência de dumping nas importações de leite em pó provenientes da Argentina e do Uruguai. “Enfrentamos essa questão há dez anos. São países que exportam leite, o reidratam e o vendem em nosso mercado a preços inferiores, com custos de produção pouco transparentes. Isso prejudica os produtores brasileiros, que são, em sua maioria, pequenos e dependem dessa atividade para seu sustento”, declarou Meirelles.
Ele acrescentou que mais de 70% dos pecuaristas de leite no Brasil possuem rebanhos entre 20 e 50 cabeças, o que evidencia a fragilidade do setor. “Estamos unidos à CNA e a outras federações para exercer pressão sobre o Congresso Nacional e buscar a correção dessa distorção. O produtor não pode continuar arcando com o ônus de políticas equivocadas”, afirmou.
As entidades setoriais defendem a implementação de medidas urgentes, incluindo o controle rigoroso das importações de lácteos, a promoção de incentivos para a exportação de produtos brasileiros e a realização de campanhas para estimular o consumo interno. Especialistas apontam que a oferta excedente em relação à demanda, combinada com a entrada de leite importado, resultou em maior disponibilidade no mercado e consequente queda nos preços.
Para o setor produtivo, a mensagem é inequívoca: sem medidas de proteção eficazes, o Brasil corre o risco de comprometer sua autossuficiência na produção de leite. “O caminho a seguir não é o abandono do produtor, mas sim a valorização daqueles que garantem o fornecimento de alimentos de qualidade para o país”, concluiu João Martins.
Fonte: Canal Rural.








