Política nacional de economia circular: avanços ambientais e desafios na governança

Câmara aprova Política Nacional de Economia Circular, priorizando princípios ambientais com foco em diálogo com o setor produtivo. O avanço busca valorizar recursos e minimizar resíduos, mas a governança e a proteção a acionistas minoritários geram debates sobre segurança jurídica e investimentos.

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Foto: Pixabay

Às vésperas da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), a Câmara dos Deputados aprovou a criação da Política Nacional de Economia Circular (PNEC). Este avanço é um marco para a posição do Brasil no cenário global. No entanto, os debates que antecederam a votação indicam que o tema ainda está longe de um consenso, com especial atenção ao impacto sobre o setor produtivo.

A legislação aprovada, fruto de 13 anos de discussões legislativas e que consolidou mais de 20 projetos de lei entre 2012 e 2024, visa impulsionar a transição de um modelo linear de consumo para uma economia focada na eficiência de recursos, na valorização de produtos em todas as etapas de seu ciclo e na minimização de resíduos e emissões.

Nas últimas semanas, o relator da proposta, deputado Luciano Vieira (Republicanos-RJ), apresentou 13 pareceres com sugestões de alterações, mas optou por suavizar sua posição inicial para viabilizar a aprovação. O texto que obteve o aval dos deputados é, em essência, o texto do Senado (PL 1874/2022), complementado com disposições sobre a proteção de acionistas minoritários, provenientes de uma proposta do Poder Executivo.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) celebrou a aprovação como um progresso significativo, ressaltando que o texto final é resultado de um amplo diálogo. O setor produtivo conseguiu, em suas negociações, a exclusão de pontos considerados críticos nas versões iniciais do substitutivo, como a imposição de mudanças compulsórias nos processos produtivos, metas não acordadas e penalidades desproporcionais. A versão aprovada concentra-se em princípios e objetivos gerais, com um tom mais diretivo e brandos nas obrigações impostas ao setor produtivo.

O projeto estabelece ferramentas importantes para a consolidação da Política Nacional, incluindo o Fórum Nacional de Economia Circular, planos de ação em níveis nacional e estadual, e modificações na Lei de Licitações para priorizar critérios de circularidade em compras públicas. O estímulo à inovação, pesquisa e desenvolvimento em tecnologias circulares promete abrir novas oportunidades de negócio e aumentar a competitividade. Os planos de ação deverão detalhar metas de redução, reaproveitamento e reciclagem de resíduos, além de definir medidas técnicas para a eliminação de rejeitos.

Outro ponto relevante conquistado na articulação foi a exigência de análise de impacto regulatório para iniciativas que resultem em aumento de custos ou imposição de obrigações aos agentes econômicos. O objetivo é assegurar previsibilidade e atuar como salvaguarda contra medidas excessivamente onerosas.

Em contrapartida, um dos aspectos mais debatidos na votação foi a incorporação de dispositivos sobre proteção de acionistas minoritários, originários do PL 2925/2023, do Ministério da Fazenda. Este tema gera apreensão, com potencial para expandir os poderes da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e a responsabilização civil de administradores de companhias abertas. O relator, no entanto, argumenta que a experiência de desastres como os de Mariana e Brumadinho evidenciou a insuficiência das atuais ferramentas de responsabilização, e que este passo é crucial para coibir atitudes mais arriscadas por parte de administradores e controladores.

A CNI já manifestou publicamente que irá pleitear aos senadores a exclusão dos artigos relacionados à governança corporativa, “de forma a preservar a coerência do projeto e garantir a segurança jurídica necessária para atrair investimentos”.

A economia circular se consolida, inegavelmente, como uma pauta estratégica para o Brasil. O principal desafio agora é encontrar o equilíbrio entre o avanço da agenda ambiental e a viabilidade econômica, impedindo que a regulamentação se transforme em um entrave para o investimento produtivo.

É importante notar que a tramitação gerou questionamentos. Embora a base do texto seja do Senado (PL 1874/2022), os deputados optaram por priorizar o PL 3899/2012, de autoria da deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ). Essa manobra regimental altera a autoria principal do tema, o que implica que o texto retornará à Câmara dos Deputados caso o Senado introduza modificações. Os próximos passos dependem agora de um acordo com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP).

*Fernanda César é gerente de Análise Política Federal e de Bens de Consumo na BMJ Consultores Associados. Com atuação desde 2017, possui vasta experiência em relações governamentais. É graduada em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e pós-graduada em Direito e Relações Governamentais pelo Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).


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Fonte: Canal Rural.